ATA DA TRIGÉSIMA QUINTA SESSÃO SOLENE DA QUARTA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA SEGUNDA LEGISLATURA, EM 31-8-2000.

 


Aos trinta e um dias do mês de agosto do ano dois mil reuniu-se, no Plenário Otávio Rocha do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às dezessete horas e vinte e cinco minutos, constatada a existência de quórum, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão, destinada a comemorar os quinhentos anos da Ordem da Congregação Franciscana no Brasil, nos termos do Requerimento nº 082/00 (Processo nº 1353/00), de autoria do Vereador Luiz Braz. Compuseram a MESA: o Vereador João Carlos Nedel, presidindo os trabalhos; o Frei Trentin, Diretor da Escola Superior de Teologia Franciscana; o Senhor Charles Kiefer, Secretário Municipal da Cultura e representante do Senhor Prefeito Municipal de Porto Alegre; o Irmão Avelino Madalozo, representante do Senhor Reitor da Pontifícia Universidade Católica – PUC; o Frei Sérgio Dal’Moro, Presidente da Família da Ordem Franciscana no Brasil; o Vereador Luiz Braz, na ocasião, Secretário “ad hoc”. A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para, em pé, ouvirem a execução do Hino Nacional e, após, concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Luiz Braz, em nome das Bancadas do PTB, PDT, PMDB, PSB, PPS e PFL, manifestou-se acerca do trabalho social e religioso desenvolvido pela Ordem da Congregação Franciscana no Brasil, discorrendo sobre dados relativos à história, desenvolvimento e atividades realizadas por essa Congregação junto à sociedade brasileira. Na oportunidade, o Senhor Presidente registrou o recebimento de correspondência alusiva à presente solenidade, enviada pelo Desembargador Luiz Felipe Vasques de Magalhães, Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Após, foi dada continuidade às manifestações dos Senhores Vereadores. A Vereadora Maristela Maffei, em nome da Bancada do PT, prestou sua homenagem ao transcurso dos quinhentos anos de presença da Ordem da Congregação Franciscana no Brasil, mencionando experiências pessoais e o contato de Sua Excelência com integrantes dessa Congregação e com as obras de cunho social e assistencial desenvolvidas pelos frades franciscanos. Na ocasião, foram registradas as seguintes presenças, como extensão da Mesa: da Irmã Edi Nicolao, representante da Congregação de Nossa Senhora de Aparecida; da Irmã Acélia Maria Stirz, representante da Associação das Irmãs Franciscanas Bernardinas; da Irmã Jandira Aliati, Vice-Diretora da Escola Menino Deus; da Senhora Lenita de Argolo Mendes, representante da Direção do Colégio Maria Imaculada; da Senhora Jeni Weber, Diretora da Escola Rainha do Brasil; da Senhora Lizete Voll, Diretora da Escola Nossa Senhora do Brasil; de representantes do Clube de Mães São Francisco; de alunas da Escola de Teologia Franciscana; de entidades, escolas e convidados presentes nesta solenidade. Após, foi dada continuidade às manifestações dos Senhores Vereadores. O Vereador João Carlos Nedel, em nome das Bancadas do PPB e PSDB, destacou a relevância da solenidade hoje realizada neste Legislativo, com referência aos quinhentos anos de existência, no Brasil, da Ordem da Congregação Franciscana, declarando que a presente homenagem representa o agradecimento do povo de Porto Alegre pelos relevantes serviços prestados por essa Congregação. Em continuidade, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao Frei Sérgio Dal’Moro, que agradeceu a homenagem hoje prestada pela Câmara Municipal de Porto Alegre aos quinhentos anos de existência da Ordem da Congregação Franciscana no Brasil. A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para, em pé, ouvirem a execução do Hino Rio-Grandense, agradeceu a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos às dezoito horas e trinta e sete minutos, convidando a todos para a Sessão Solene a ser realizada a seguir. Os trabalhos foram presididos pelos Vereadores João Carlos Nedel e Luiz Braz e secretariados pelo Vereador Luiz Braz, como Secretário “ad hoc”. Do que eu, Luiz Braz, Secretário “ad hoc”, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pelos Senhores 1º Secretário e Presidente.

 

 

 


O SR. PRESIDENTE (João Carlos Nedel): Estão abertos os trabalhos da presente Sessão Solene em comemoração aos quinhentos anos da Ordem da Congregação Franciscana no Brasil. Convidamos para compor a Mesa o Reverendo Frei Sérgio Dal´Moro, Presidente da Família da Ordem Franciscana no Brasil; o Reverendo Frei Trentin, Diretor da Escola Superior de Teologia Franciscana; o Sr. Charles Kiefer, Secretário de Cultura, representante do Prefeito Municipal e Irmão Avelino Madalozo, representante do Reitor da PUC.

Esta Sessão Solene foi proposta pelo Ver. Luiz Braz para expressar a homenagem do povo de Porto Alegre pelos quinhentos anos da Ordem da Congregação Franciscana no Brasil, juntamente no dia em que iniciamos a Semana da Câmara Municipal de Porto Alegre e, amanhã, iniciaremos a Semana da Pátria.

Convidamos todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Nacional.

 

(Executa-se o Hino Nacional.)

 

O Sr. Luiz Braz está com a palavra para falar em nome do PTB, PDT, PMDB, PSB, PPS e PFL.

 

O SR. LUIZ BRAZ: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Cumprimento também o Clube de Mães São Francisco de Assis, que manda uma representante, minha querida amiga Carmem França; Sr.ª Presidenta do Conselho Geral de Clubes de Mães; minhas queridas amigas da Escola Rainha do Brasil, onde meus filhos estudaram. Não posso deixar de pensar em São Francisco de Assis, em sua vida fantástica, cheia de solidariedade e alegria, neste momento em que prestamos homenagem ao meio milênio de presença dos franciscanos nesta Pátria.

Ser franciscano é ter a coragem para se despojar de todos os seus bens terrenos e se doar inteiramente aos mais necessitados. A história da vida de São Francisco é marcada pela renúncia dos prazeres mundanos e entrega total para a resolução dos problemas dos mais necessitados. Qual de nós conseguiu chegar a este grau de evolução, independente do cumprimento de obrigações religiosas? Parece simples, mas não é. Resolver que o egoísmo está riscado do nosso viver, que a palavra solidariedade deixou de ser uma discussão teórica para ser uma prática constante; pensar que esta atitude não representa qualquer tipo de sofrimento, mas sim, uma realização da criatura humana, enquanto filho de Deus, criador de todas as coisas. A certeza de que a nossa missão maior é a da convivência fraterna, quando o estender das mãos em direção ao próximo é o despertar da nossa energia positiva transformando nossos irmãos em pessoas cheias de esperança e graça divina, agentes da construção de uma nova sociedade, mais igual e mais justa, baseada no amor de Cristo pela humanidade.

Foram muitos os problemas que os franciscanos tiveram que enfrentar para implantar seu trabalho no Brasil; mas o que importa é que eles foram fortes e valentes e conseguiram vencer os obstáculos que se antepuseram ao seu crescimento. A prova maior são as centenas de congregações hoje existentes, e elas são mais de quatrocentas, são frutos de anos de muito sofrimento e dedicação ao próximo. Só para medirmos os esforços necessários a fim de contemplarmos as obras da atualidade, citamos o fato de que em 1889, época da Proclamação da República, somente existiam no Brasil nove membros da província Santo Antônio, e um membro pertencente à província Imaculada Conceição. A história registra que, nessa época, a Congregação dos Franciscanos quase definhou, em termos de Brasil, muito embora esses fatos históricos, eles vão ser referenciados depois, pelo Frei Sérgio Dal ’Moro, que é quem realmente mais conhece esta passagem dos franciscanos aqui nesses quinhentos anos de Brasil.

Essa quase falência das idéias franciscanas em nossa Pátria deveu-se ao fato de que, em 1855, o governo proibia a aceitação de noviços, enquanto não fosse assinada uma concordata com a Santa Sé. O Governo queria provocar a morte lenta das ordens religiosas a fim de ficar com o seu vasto patrimônio. Esse período de declínio só pode ser medido através dos dados publicados do que representou a Ordem dos Frades Menores, por volta de 1760, ocasião em que somaram um mil, cento e sessenta membros.

O martírio vivido pelos franciscanos, durante toda a sua vida, é reflexo do caminho que São Francisco de Assis escolheu trilhar para comunicar-se com o nosso universo. São Francisco, por ser Santo, era uma pessoa incomum, que, para atingir os seus objetivos, seguia ao pé da letra todos os ensinamentos de Cristo; ele queria reproduzir na carne os mesmos sofrimentos passados por Jesus, em suma, ele também queria, através de sua entrega total aos princípios da fraternidade, remir os pecados da humanidade.

Ninguém poderia ter menos do que ele em bens materiais, chegava a entregar a sua única veste para aquele que precisasse. Como um ser especial, neste “vale de lágrimas”, excepcionais são alguns de seus atos, como aquele conhecido conto do grande lobo, que apavorava toda uma comunidade; a fera já tinha feito muitas vítimas, quando lá chegou o jovem Francisco, somente alguém com capacidade para falar com os animais poderia resolver o problema naqueles moldes. Depois do encontro entre a fera e o Santo, aqueles aldeões puderam viver em paz, assistindo, festivamente, à partida do lobo para outras paragens.

Difícil para aqueles que escolhem passar por esses mesmos caminhos a vitória em suas missões, mas, algo fica evidenciado, quando encontramos um verdadeiro franciscano: sua forma fraterna de encarar a vida, sua decisão de enclausurar o seu ego para viver única e exclusivamente pelo amor ao próximo.

Eu sei que aqui em Porto Alegre existem várias congregações e fraternidades franciscanas, mas eu vou-me reportar ao encontro seguido que tenho com os Frades Menores. Freqüentemente nos velórios e, infelizmente, para mim, são inúmeros esses acontecimentos, pois muitos são os meus amigos e nenhum conseguiu ter o dom da eternidade aqui neste mundo material, embora saiba que a verdadeira vida prossegue em outros planos. Ouvi, várias vezes, nessas pregações, correções que fazem a muitas interpretações bíblicas, e, uma delas, a que mais me marcou por concordar com ela, está na progressão do espírito, assemelhando-se mais ao pensamento espiritualista, e fugindo um pouco de alguns dogmas da Igreja Católica. Essa maneira de ver as coisas me aproxima mais do catolicismo, pois enxergo, nesses atos, avanços que merecem ser sopesados.

A grande vitória dos franciscanos está na concretude das suas obras evangelizadoras nos setores mais diversos da vida da nossa sociedade. Suas missões, atualmente, se desenvolvem no campo da educação, nas muitas escolas existentes, como a Escola de Educação Básica Rainha do Brasil, a Escola de 1º Grau Menino Deus, o Colégio Maria Imaculada, o Instituto Frei Pacífico, Escola de 1º Grau N. Sr.ª do Brasil, Pia Instituto Pedro Chaves Barcellos, Colégio N. Sr.ª do Bom Conselho, Escola Santa Família e Instituto N. Sr.ª da Piedade.

Mas a obra franciscana não se restringe apenas às escolas, ela também se faz sentir em muitos hospitais, obras sociais, paróquias e tantos outros lugares.

A vida dos Franciscanos deve servir de exemplo para a humanidade, todos nós temos a obrigação de diminuir o nosso ego e nos entregar a uma vida mais fraterna. A palavra de ordem deve ser solidariedade, pois foi ela que fez muita falta nos últimos tempos.

Vamos estender nossas mãos àqueles que realmente precisam, vamos varrer egoísmos e vaidades dos nossos corações e, finalmente, vamos assumir um compromisso de amar ao próximo sem esperar nada em troca, de se doar para o bem da humanidade, assim como fazem os verdadeiros franciscanos, autores de uma das páginas mais bonitas escritas na história da nossa Pátria. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Carlos Nedel): Nós registramos o recebimento da seguinte correspondência: (Lê.)

“Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul Grande do Sul –

Gabinete da Presidência, Ver. João Motta

Na impossibilidade de me fazer presente à Sessão Solene em comemoração aos quinhentos anos da Ordem, da Congregação Franciscana no Brasil, agradeço a honra do convite e envio cumprimentos pela realização do evento.                           

Porto Alegre, 17 de agosto de 2000.

                                      Des. Luiz Felipe Vasquez de Magalhães

                                               Presidente.”

A Ver.ª Maristela Maffei está com a palavra para falar em nome do PT.

 

A SRA. MARISTELA MAFFEI: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) O Ver. Luiz Braz nos agraciou com este momento que nos possibilita dizer algumas coisas sobre o quão caro é e o quanto cala o meu coração em poder estar aqui para homenagear e dizer algumas coisas do sentimento do que é ter um pouco de conhecimento sobre a família franciscana.

Peço licença para fazer um pequeno depoimento pessoal. Quando a minha família veio do interior de Lajeado, nós já conhecíamos os franciscanos. Fui batizada pelo Frei Constantino, antes de ele ir embora do Brasil; em seu lugar ficou o Frei Sérgio Dill. Quando chegamos em Porto Alegre fomos morar na Lomba do Pinheiro, onde novamente encontramos os franciscanos. Foi graças a esse encontro que nós conseguimo-nos estruturar, pois quando se vem do interior para a cidade, espera-se muita coisa, mas quando se chega aqui descobre-se que é uma selva. Os freis ajudaram a nos encontrarmos; fundamos a comunidade da Vila Santa Helena, onde conhecemos o Frei Nelson e o Frei Mário Schuck, uma pessoa muito querida sobre quem falei há alguns dias, que nos foi muito caro e que nos deixou muito cedo, deixando saudades. Foi graças a essas pessoas, a quem devo muito, que com toda a certeza hoje estou aqui.

Fiz minha opção por Sociologia, por influência dos franciscanos; fiz minha opção de atuar, e estar neste momento político, por influência dessa congregação.

Quando São Marcos, no capítulo 15, versículo 16, diz: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda a criatura!”, com certeza eu sou uma das pessoas em que a palavra de Jesus e de Maria chegou, através dos franciscanos, até a minha família. E muito mais do que isso, queria dizer que a comunidade da Lomba do Pinheiro, de onde sou oriunda, o seu desenvolvimento tem muito a ver com a chegada dos franciscanos. Desde a luta do esgoto, da luz, da água, das escolas, tem muito a ver, porque eles motivavam a comunidade a participar. E até hoje eles fazem isso, Ver. Luiz Braz, que é sabedor disso: as colchas de retalho do Clube de Mães, as hortas comunitárias, a farmácia comunitária, o aprendizado. A sobrevivência de muitas e muitas crianças, através da farmácia, do ensinamento às mães, o acompanhamento às mães gestantes. Todas essas coisas fazem parte da vida dos franciscanos. Mas mais forte ainda é a influência da formação e da informação. Eles jamais tiveram posicionamento de chegar como se fossem os soberanos, eles também abriram seus corações para aprender junto com aquela comunidade pobre, humilde. E ali houve um crescimento. E até hoje é uma integração muito precisa, muito forte daquela comunidade junto com os franciscanos. E também aos capuchinhos, que é uma grande família.

Esses quinhentos anos foram quinhentos anos, não daqueles que vieram para o nosso País para ajudar a propiciar o empobrecimento, ao contrário, fortaleceram os movimentos sociais, ajudaram a perceber a força de uma comunidade a se rebelar contra as injustiças. Então, nesses quinhentos anos, ainda bem que vocês vieram juntos com o chamado descobrimento deste País. Porque foram uma das poucas vertentes que vieram para este País para ajudar, para fazer com que o povo tivesse uma crença na sua independência, na sua autonomia, nos seus valores morais, no valor da família, na estrutura desta sociedade, que tanto sonhamos, que é o reino. E que, talvez, partidariamente coloquemos outro nome, dentro da ideologia de cada partido. Entretanto, esses quinhentos anos de formação e informação influenciaram muitas pessoas e continua influenciando, como se fosse parte, como se fosse cada célula que temos nos nosso corpo. Digo isso com o maior carinho e com todo respeito que tenho pela Congregação. Fizemos, lá na Lomba, há pouco tempo, um grande encontro, - hoje, tivemos a presença do Governador do Estado - onde partilhamos esses quinhentos anos e onde lembro, como se fosse neste momento, os freis também pediam perdão pelas injustiças que houveram na caminhada. Isso é um ato de grandeza que poucos segmentos fazem, mas esse segmento teve essa grandeza, essa altivez, de num determinado momento, pela sua cultura, pela sua formação, esquecer algumas coisas importantes, mas que na história fizeram jus e recuperaram junto a comunidade, a intenção verdadeira que Jesus Cristo e Nossa Senhora sempre quiseram pregar para a humanidade.

Termino, dizendo que o meu pai foi seminarista, meu irmão foi seminarista e muitas pessoas que eu conheço também o foram, dizer do momento feliz de ter tido a influência dos franciscanos, mas também dizer que toda a humanidade deve um pouco a esses quinhentos anos, principalmente no nosso País, dessa história, dessa caminhada bonita que os franciscanos fizeram junto a nós. Mais do que nunca olhar para dentro do coração e olhar de frente para a história e saber os limites que às vezes a história nos dá e que ajuda a cristalizar alguns valores destruidores, mas que acima de tudo fizeram um reconhecimento de que somente uma caminhada peregrina de fato, onde a gente possa abraçar todos os irmãos e as irmãs o reconhecimento de cada um tem a importância vital na formação de uma sociedade justa e igualitária.

Por isso quero cumprimentar a todos que aqui estão e dizer que somente com pessoas com esse segmento, que tem esses valores e que tem essa vontade verdadeira de transformar uma nação e o universo é que nós realmente podemos constituir uma sociedade de irmãos. Muito obrigada.

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Carlos Nedel): Eu gostaria de nominar as autoridades presentes e que se constituem extensão da nossa Mesa Diretora: a representante da Congregação de Nossa Senhora de Aparecida, Irmã Edi Nicolao, que é irmã do meu grande amigo Avitos; representante da Associação das Irmãs Franciscanas Bernardinas, Acélia Maria Stirz; Vice-Diretora da Escola Menino Deus, Irmã Jandira Aliati; representante da direção do Colégio Maria Imaculada, Sr.ª Lenita de Argolo Mendes; Diretora da Escola Rainha do Brasil, Sr.ª Jeni Weber; Diretora da Escola Nossa Senhora do Brasil, Sr.ª Lizete Voll; representantes do Clube de Mães São Francisco; alunas da Escola Superior de Teologia Franciscana e demais entidades e autoridades aqui presentes.

Solicito ao Ver. Luiz Braz, proponente desta homenagem, que assuma a presidência dos trabalhos.

 

(O Ver. Luiz Braz assume a Presidência dos trabalhos.)

 

O SR. PRESIDENTE (Luiz Braz): O Ver. João Carlos Nedel está com a palavra e falará em nome de sua Bancada, o PPB, e da Bancada do PSDB.

 

O SR. JOÃO CARLOS NEDEL: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) A Sessão Solene que agora se realiza é, sem dúvida, um fato de importância singular, que é a presença, em nosso País, da Primeira Ordem de São Francisco de Assis, Ordem de Frades Menores, acompanhando desde o início os quinhentos anos de vida e de história do Brasil.

Minha saudação especial ao nobre Ver. Luiz Braz, proponente dessa homenagem, cuja realização o dignifica e engrandece. Parabéns, Ver. Luiz Braz.

Como Vereador católico, é com intensa e renovada emoção que assumo esta tribuna, representando meus colegas de Bancada do Partido Progressista Brasileiro, os ilustres e dignos Vereadores João Dib e Pedro Américo Leal, e também a Bancada do PSDB, integrada pelos igualmente dignos Vereadores Antonio Hohlfeldt e Cláudio Sebenelo.

Ao fazê-lo, quero então reforçar a justiça e a grandeza deste ato, que, entre outras coisas, é também um agradecimento patriótico do povo de Porto Alegre à Primeira Ordem de São Francisco pelo trabalho até aqui realizado em nosso Brasil.

É fruto, talvez, de coincidência, mas, por certo, é a vontade de Deus que esta cerimônia se realize exatamente à véspera do início da Semana da Pátria.

Pensando nisso, desejo fazer deste pronunciamento, e a ocasião é própria, uma oração para a qual peço o acompanhamento e reflexão dos presentes. (Lê.)

 “Senhor Nosso Deus, nós te louvamos, porque, em tua infinita bondade, foste tão generoso com a nossa Pátria e com a nossa gente, dando-nos uma imensidão de graças e benefícios que, muitas vezes, não reconhecemos ou não sabemos aproveitar. E a tal ponto nos cumulaste de graças que nossa irreverência, também uma graça que nos deste, nos faz afirmar, diante do mundo, que também és brasileiro. Foi tão sábia tua vontade que, já ao despertar da história do Brasil, enviaste junto com os descobridores, um representante da Primeira Ordem de São Francisco, Frei Henrique de Coimbra, para dar assistência religiosa aos navegantes e para evangelizar os povos aqui já habitantes. Louvor e glória a Ti, Senhor. Queremos Te agradecer também. Queremos Te agradecer por toda a ação e todos os trabalhos que a Primeira Ordem de São Francisco aqui realizou ao longo desses quinhentos anos e que, com toda a certeza, ajudaram a construir o caráter de nosso povo e a identidade de nossa Nação.

E, finalmente, Senhor, queremos-Te fazer um pedido: nós Te pedimos que continues olhando sempre pelo Brasil. Queremos Te pedir que mantenhas viva e atuante em nossa Pátria a Primeira Ordem de São Francisco, do mesmo modo que todas as demais instituições católicas que para cá vieram e que prestam ao povo e à Pátria serviços tão relevantes, destacadamente, nos campos da saúde e da educação, que seria inimaginável, hoje, prescindir de seus serviços, pois significaria a implantação do caos, de imprevisíveis conseqüências sociais no Brasil. Dá-lhes novas e santas vocações, que possam emergir dos lares brasileiros, ampliando as possibilidades de atendimento às necessidades de nossa gente. Abençoa, Senhor, a Primeira Ordem de São Francisco e a nossa Igreja, e dá a ela força necessária para que, com humildade cristã, se mantenha a serviço de nosso povo, no acolhimento, na evangelização e no atendimento, ajudando-o a viver melhor e a ser mais feliz. Apesar das agruras, das dificuldades e das incompreensões que o mundo lhes impõe, mas que a fortalecem e a santificam.”

Parabéns à Primeira Ordem de São Francisco cuja história, durante quinhentos anos, se confunde e se identifica com a história do Brasil.

E que Deus abençoe seus integrantes, servos e mensageiros da Sua Divina vontade. Assim, seja. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Luiz Braz): Eu quero aproveitar que estou presidindo os trabalhos, momentaneamente, e quero agradecer muito a minha querida amiga, Irmã Inês, da Ordem de N. S.ª Aparecida. Ela me ajudou muito a colher dados, na comunicação com as instituições franciscanas, a fim de que pudéssemos realizar esta Sessão de hoje, para marcar os quinhentos anos dos franciscanos no Brasil.

Então, a Irmã Inês; a Geni, Diretora do Rainha do Brasil, muito obrigado por toda a ajuda que me deram para a realização desta Sessão.

Eu não poderia deixar de citar o Frei Sérgio, pois, desde o primeiro contato que fizemos, ele mostrou uma amabilidade muito grande e uma disposição de vir aqui e abrilhantar o ato de hoje. Eu acho que não poderíamos deixar escoar este ano de 2000 sem marcar, na Câmara de Vereadores, os quinehtnos anos da vinda dos franciscanos.

Por isso, quero agradecer a todas as senhoras e senhores, exatamente, por propiciarem a possibilidade de a Câmara Municipal de Porto Alegre estar hoje fazendo esta Sessão Solene.

Devolvo a presidência dos trabalhos ao Ver. João Carlos Nedel.

 

(O Ver. João Carlos Nedel assume a Presidência dos trabalhos.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Carlos Nedel): O Reverendo Sr. Frei Sérgio Dal’Moro está com a palavra em nome da Ordem Franciscana no Brasil.

 

O SR. SÉRGIO DAL’MORO: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais pressentes.) Quero saudá-las do jeito franciscano: passem bem! (Passem bem! Amém!)

Inicio esta minha fala com um muito obrigado. Agradeço esta homenagem a nossa história franciscana e a oportunidade de poder dizer algo a respeito nesta nobre Casa.

Como franciscanos e franciscanas, também celebramos neste ano, com os quinhentos anos da chegada dos europeus, os quinhentos anos da chegada dos Filhos de São Francisco a esta Terra.

Essa celebração teve como evento principal a realização do Congresso Franciscano em Canindé, no Ceará, do dia 22 ao dia 26 de julho, passados. Lá estivemos num número superior a dois mil franciscanos e franciscanas. Representamos, aproximadamente, trinta e quatro mil, de todos o País. Esse Congresso foi longamente preparado. Em 1999, doze congressos regionais foram realizados em diversos Estados do Brasil.

Nos primeiros meses deste ano, três peregrinações: do Sul, do Oeste e do Norte, apontando para Fortaleza e Canindé, percorreram milhares de quilômetros, espalhando por todo o Brasil mensagens de justiça, solidariedade, paz e bem. Nos dez dias que precederam o Congresso, aconteceu uma grande caminhada de Fortaleza a Canindé. Quatrocentos e cinqüenta peregrinos percorreram a pé, nesse tempo, os 132km que separam essas duas cidades. No entanto, essas celebrações não tiveram um caráter triunfalista, são dois mil anos da Encarnação do Verbo, quinhentos anos de franciscanismo no Brasil que necessitavam ser celebrados. Esses números objetivamente iguais a todos os demais são portadores de uma carga simbólica. Toca-nos a sensibilidade, cria expectativas, suscita projetos. Nossas celebrações foram, antes de tudo, marcadas pelos ritos penitenciais, porém também de louvor. Estudamos, refletimos, resgatamos a nossa história, nela encontramos heroísmos e ambigüidades, vitórias e derrotas, solidariedade e ambição, santidade e pecado. Como homens e mulheres da história, nelas marchamos sempre humanos e humanas.

Pediram-me para narrar essa história. Para melhor me explicar, faço um rápido recuo até o século XII e XIII da nossa era. A sociedade italiana dessa época passava por profundas transformações. O modelo feudal de sociedade estava chegando ao fim, em seu lugar, começava a se firmar a burguesia emergente, tendo como força de afirmação o comércio. A pequena Cidade de Assis, do vale da Úmbria, na Itália central, na virada do século XVII para XIII, já havia feito a sua revolução, mudado o modelo, porém não a estrutura. A sociedade feudal, formada por nobres e plebeus, foi substituída pelo sistema burguês emergente, agora, são os maiores e menores. Houve um homem, filho de Pedro Bernardone, chamado Francisco Bernardone, que conhecemos como Francisco de Assis. Ele nasceu por volta de 1182, filho de família comerciante, dos maiores, portanto; viveu sua infância e juventude nesse meio, sua vida fácil e folgazã não o satisfazia, um vazio interior e existencial o perturbava. Depois de muitas buscas, teve uma profunda intuição que, mais tarde, simplesmente a definiu como Regra e Vida “viver o Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo”. Esta intuição, do espírito, sem dúvida, se manifestava no desejo de acolher a todos como irmãos e irmãs. Por isso decidiu mudar de lugar social. No ambiente dos maiores, marcado pela concorrência, cobiça, competição e divisão, não era possível tornar real esta intuição. Por isto saiu do centro para a periferia. Ali, entre os menores, começa uma experiência de frugalidade, pobreza e solidariedade. O primeiro ano provocou escândalo; em seguida, admiração. Imediatamente, começam a aparecer companheiros e nasce, então, a experiência da fraternidade. Em 1209, verbalmente, o Papa aprova a Primeira Fraternidade Franciscana. Numa sociedade cansada de competição, guerras, concorrência e cristianismo de fachada o impacto da nova vida foi imenso. Jovens e adultos, de todas as classes, pediam para fazer parte da nova proposta evangélica. Três anos depois uma jovem de grande formosura, também da classe dos maiores, inicia, com o apoio de Francisco, a Fraternidade das Irmãs. Hoje, as conhecemos como as Irmãs Clarissas de Santa Clara. Homens e mulheres casados também desejam viver a experiência. Não podiam, porém, abandonar seus compromissos familiares. Para eles, Francisco, em 1221, fundou a Ordem dos Penitentes, lhes propondo viver na solidariedade, na justiça, sem violência, na paz e no bem. É o que hoje conhecemos como Ordem Franciscana Secular. Se constituía, assim, a Primeira, Segunda e Terceira Ordem de Francisco e Clara de Assis. Quando Francisco partiu para a casa do pai, em 1226, o movimento franciscano já se espalhara por toda a Europa, inclusive a Península Ibérica. No decorrer dos séculos diversas reformas e novas fundações de inspiração franciscana enriqueceram de forma extraordinária toda a história franciscana.

Hoje, a Primeira Ordem é formada por três grandes ramos: os Franciscanos Menores, Franciscanos Capuchinhos e Franciscanos Conventuais. As Irmãs Clarissas, a dita Segunda Ordem, também com reformas e novas fundações espalhadas por todo mundo. Da mesma forma a Ordem Franciscana Secular. Nasce também, de maneira vigorosa, a Terceira Ordem Regular, formada por centenas de congregações masculinas e, principalmente, femininas de inspiração franciscana. Muitas dessas estão aqui presentes. Parecem-me importantes essas explicações, para melhor podermos entender o significado das comemorações dos quinhentos anos do franciscanismo no Brasil.

A seguir tentarei, rapidamente, mostrar como em nossa terra de Santa Cruz se implantou o carisma de Francisco e Clara de Assis.

No dia 8 de março de 1500, com treze caravelas e com mil e quinhentos tripulantes, embarca Pedro Álvares Cabral em Lisboa, sob as vistas do bispo local e do Rei Dom Manuel I, acompanhado por oito franciscanos e mais oito padres diocesanos, cujos nomes são ignorados, tendo como chefe Frei Henrique de Coimbra, todos com destino à Índia. Eis que aos 21 de abril, terça-feira de Páscoa, aparecem ervas flutuando nas ondas, sinalizando terra próxima. No dia seguinte, à tardinha, 22 de abril de 1500, ergue-se à distância um monte que Cabral denominou de Monte Pascoal. Aos 24 de abril de 1500, a esquadra entra na baía de Porto Seguro, quatro léguas da cidade do mesmo nome, permanecendo até 2 de maio para tomar contato com os índios tupiniquins. No domingo, 26 de abril, Frei Henrique de Coimbra rezou a primeira missa num ilhéu, o da Coroa Vermelha, assistida pelos portugueses e por aproximadamente sessenta pacíficos índios tupiniquins. No dia 1º de maio é rezada a segunda missa em terra firme, diante de uma cruz de madeira construída por dois carpinteiros. No dia seguinte, a esquadra parte para as Índias.

Depois dessa histórica, mas rápida presença, até 1585, os fransciscanos fizeram presença esporádica, sem continuidade. Em 1516, enviados de Portugal, chegaram na região de Porto Seguro dois frades para assistir aos portugueses que aqui já tinham-se estabelecido e para evangelizar os índios. Aqui já começa a se manifestar a contradição do projeto colonizador que dizia querer anunciar Jesus Cristo e submeteu os índios a um tratamento desumano. Consta que “...colonos gananciosos exploravam e oprimiam os ingênuos tupiniquins, e, como a maldade desumana não conhecesse limites, os índios trataram de vingar-se”. Num dia de feira em Porto Seguro, os índios atacaram. Começando a matança pelos dois frades, dois índios vestiram em seguida seus hábitos e entraram na feira, dando sinal para o ataque geral dos demais índios que estavam escondidos. Foram poucos os sobreviventes; esses, mais tarde, com a chegada dos jesuítas, juntamente com os índios batizados, narravam os fatos, elogiando a atividade missionária dos dois franciscanos. O acontecimento ter-se-ia dado por volta de 1518.

Frei Pedro Palácios, da Espanha, vem para a Bahia em 1558. Vai para o sul, no Espírito Santo e, em Vila Velha, constrói o primeiro templo franciscano. José de Anchieta dá testemunho de seu heróico trabalho.

Em 13 de março de 1584, é constituída, por decisão do Ministro-Geral, a primeira custódia do Brasil. Se chamou Custódia Santo Antônio do Brasil, com sede em Olinda. Expandiu-se rapidamente, chegando até São Paulo e se constituiu em província em 1657.

Dada a dificuldade das distâncias, em 1659, foi constituída a Custódia da Imaculada Conceição, com sede no Rio de Janeiro. Poucos anos depois, em 1675, foi constituída Província.

A expansão dos frades foi considerável até 1760. Seu número atingiu mil cento e sessenta membros. Nesse ano, a Corte Imperial fechou os noviciados, o que provocou a morte lenta das ordens religiosas, e apoderou-se de seu patrimônio.

Em São Paulo, ao lado da Casa dos Frades, ainda está lá o prédio da Faculdade de Direito, que foi propriedade dos frades, que foi tomada pelo governo. Os frades foram quase à extinção.

Com o advento da República e a separação da Igreja e do Estado, se reinicia a restauração com grande exuberância.

Hoje, os Frades Menores estão em todo o Brasil, distribuídos em quatro províncias e quatro vice-províncias. Os Frades Menores chegaram ao Rio Grande do Sul, procedentes de Minas Gerais, em 1926. Constituem hoje a Província São Francisco de Assis. São cento e vinte e seis frades presentes em dezesseis paróquias, duas na Capital, missões populares, pastorais específicas, comunidades eclesiais de base e serviços de solidariedade humana.

Direi algo também sobre as outras ordens e congregações, pois a comemoração dos quinhentos anos é do franciscanismo e não apenas de uma representante do franciscanismo no Brasil.

Os Frades Menores Conventuais chegaram ao Brasil em tempos recentes. Os primeiros chegaram em 1946. São em torno de duzentos frades, principalmente presentes nos estados mais centrais do Brasil. No Rio Grande do Sul eles estão presentes no Bairro Desvio Rizzo, em Caxias do Sul.

Os Frades Menores Capuchinhos começaram a existir como reforma franciscana em 1528. Chegaram ao Brasil, pela primeira vez, em 12 de agosto de 1612, no Maranhão, com os invasores franceses. Com os franceses, eles também foram expulsos em 19 de novembro de 1914, dois anos e pouco depois, permanecendo, porém, dois missionários para atender os índios. Pelos relatos que deixaram, sabemos que trabalham entre os índios tupinambás e tabajaras. Embora sujeitos às ambigüidades de sua condição de conquistadores, manifestaram um carinho e encantamento muito especial pelos índios, não muito freqüente naqueles tempos.

Nessa ocasião, nos conta Frei Cláudio, um velho índio, ao presenciar o batismo de crianças, também quis ser batizado, assim argumentando: “Se é preciso crer em Deus e ser instruído no seu conhecimento antes de alcançar o batismo, não poderá Deus descer em meu coração desde já e dar-se a conhecer a mim, de modo que eu, nele acreditando, possa ser batizado?”

Comenta Frei Cláudio que tais palavras não eram de um selvagem, de um pagão, mas de uma alma tocada pela força do Espírito Santo. O missionário reconhece assim a santidade presente no meio de um povo que os europeus insistiam em barbarizar. As conveniências da dominação européia produziam o bárbaro que, por sua vez, reagia com extrema sensibilidade e fineza de espírito à ação do Espírito Santo, que não se deixa apropriar pelo branco, cristão e civilizado.

Falando da longevidade e da amizade dos tupinambás, o capuchinho não resiste em compará-lo com os franceses. Os índios são todos bem feitos e proporcionados, graças ao clima temperado, mas também pelo fato de andarem nus. No relacionamento entre si, os tupinambás têm uns para com os outros tão cordial amizade que todos se chamam mutuamente de pai, irmão, irmãozinho, tio, primo, como se pertencessem a uma só família. Tornando-se cristãos, formarão um povo bem carinhoso, com a condição de que se mantenham na mesma simplicidade e temperamento.

Admirado da cordialidade e amizade dos índios em seus relacionamentos, Frei Cláudio os contrapõe à violência dos projetos colonizadores. Herdeiros do etos de Francisco, os frades não deixam de constatar a falsidade do branco em confronto com a transparência do índio. À liberdade dos tupinambás, Frei Cláudio opõe a avidez de acumulação de bens dos seus compatriotas franceses, a ponto de afirmar que o bárbaro age como cristão e o cristão como bárbaro.

A nudez dos índios, sobre a qual incide um dos maiores preconceitos do branco europeu, é vista pelos frades como natural, tranqüila, sem vergonha de mostrar o corpo nu e sem a malícia com que os brancos a vêem. Nada há de detestável e perigoso em ver a nudez dos índios, em sua simplicidade, ao contrário dos atrativos lúbricos das mundanas da França.

A dança dos tupinambás também atrai a atenção dos frades, porque está muito distante da desonestidade e licenciosidade comum das danças dos franceses.

Frei Cláudio sintetiza assim sua admiração pelos tupinambás: “Em verdade imaginava que eu iria encontrar verdadeiros animais, selvagens e rudes; enganei-me porém totalmente. No que diz respeito aos sentidos naturais, tanto internos como externos, jamais achei alguém, indivíduo ou nação que os superasse”.

Depois da expulsão dos holandeses, chega à Bahia Frei Martinho de Nantes para reforçar o trabalho de outros capuchinhos que aqui já se encontravam. Toma posição clara em favor dos índios, contra os poderosos coronéis sertanejos. Para o exercício da missão estabelece quatro condições: aprender a língua dos índios; ter com eles grande caridade; ter grande desinteresse pessoal pelas coisas temporais e um grande devotamento, protegendo os índios contra todos os que os oprimem; ter grande amor à castidade e respeito pela nudez e fragilidade das índias. Parece que o missionário quer-se referir a um mínimo do que hoje designamos por inculturação, pobreza, desapropriação e equilíbrio afetivo.

Procedentes de muitas origens européias, os capuchinhos estão presentes hoje em todo território nacional. No Rio Grande do Sul, chegaram em 18 de fevereiro de 1896, procedentes da França. Somos, atualmente, em torno de duzentos e cinqüenta frades e atuamos nos meios de comunicação social, em paróquias - três na capital -, nas comunidades eclesiais da base, missões populares, pastorais específicas, formação teológica, apoio a portadores de HIV. Com Frades Menores constituem uma fraternidade de inserção rural, de apoio aos colonos assentados, no município de Tupanciretã.

A segunda ordem, das Irmãs Clarissas, chegou ao Brasil no dia 9 de março de 1677. Hoje estão presentes no Brasil em dezessete mosteiros. Em Porto Alegre temos o Mosteiro de São Damião, na Rua Vicente da Fontoura.

Ordem Franciscana Secular: já em 1585 havia uma fraternidade em Olinda. Hoje abrange todo o território nacional. Está organizada em quinze regiões, quinhentos e noventa fraternidades, com vinte e três mil professos aproximadamente. A ala jovem é constituída pela Jufra, com mais de mil membros distribuídos em quatorze regionais.

A vida religiosa na Igreja experimentou uma grande renovação nos séculos XIX e XX.

O franciscanismo como carisma, um pouco silencioso, também passou por uma vigorosa descoberta. Isso se manifestou, concretamente, em um grande número de novas fundações de congregações religiosas com inspiração franciscana. É a riqueza da Terceira Ordem Regular. Só no Brasil, atualmente, o número de congregações franciscanas chega perto de uma centena.

O carisma franciscano é muito criativo. Não está confinado em legislação rígida, e, por isso, sempre reaparece com novas fundações.

No Rio grande do Sul estão presentes dez congregações de inspiração franciscana da Terceira Ordem Regular; Para não nos prolongarmos, destacamos as que têm presença nesta Cidade. Estão em Porto Alegre:

As Irmãs Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã; as Irmãs Franciscanas Missionárias de Maria Auxiliadora; as Irmãs Franciscanas Bernardinas; Irmãs Franciscanas Capuchinhas de Madre Rubatto; Irmãs Missionárias Franciscanas do Verbo Encarnado; e finalmente, as Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora Aparecida, as populares “aparecidinhas”, única congregação fundada aqui em Porto Alegre. Espero não ter esquecido nenhuma outra. Por isso faço um destaque especial às Irmãs “aparecidinhas”.

Madre Clara Maria de Azevedo e Souza, com o apoio do capuchinho Frei Pacífico de Bellevaux funda a congregação no dia 24 de junho de 1928. A nova congregação se propunha a atender as pessoas e as classes mais abandonadas que não têm lugar nem vez na sociedade. Hoje a Congregação das Irmãs Franciscanas da Nossa Senhora Aparecida é constituída de cento e vinte irmãs, distribuídas em vinte e seis fraternidades e tem significativa presença em Porto Alegre, em outros municípios do Rio Grande do Sul, em Santa Catarina, no Mato Grosso do Sul, Bolívia e Guiné-Bissau, na África.

Irmãs e irmãos, senhoras e senhores, as Ordens e Congregações Franciscanas formam no Brasil um imenso mosaico. Há quinhentos anos o franciscanismo chegou a esta terra. Os homens que o trouxeram carregavam no peito a utopia de “construir no novo mundo um mundo novo”. Durante cinco séculos, o carisma franciscano implantado em nosso solo, apesar dos equívocos históricos inevitáveis, foi crescendo, multiplicando-se, colorindo o Brasil de norte a sul. Permitam-me faltar à modéstia: como Presidente da Família Fraciscana do Brasil, pessoalmente posso testemunhar: a alma brasileira tem cores franciscanas.

É doloroso constatar que a exclusão, a discriminação, a violência, a corrupção, a falta de respeito pelo criado vem violentando mais do que nunca essa história. Temos consciência que também carregamos limitações. No entanto, mais do que nunca, constamos pessoalmente, irmãs e irmãos, das mais diversas ordens e congregações, consagrados e leigos, franciscanamente comprometidos com os pequenos, com os excluídos, com as crianças desnutridas, com os agricultores sem-terra, com os trabalhadores, com toxicômanos e doentes de AIDS, e tantos outros grupos de exclusão. Esta história humilde e pequena o futuro vai contar. Certamente serão outros quinhentos.

Ver. Luiz Braz, muito obrigado. Senhoras e Senhores, Irmãos e Irmãs, pela sua atenção, muito obrigado. Paz e bem. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Carlos Nedel): Convidamos todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Rio-Grandense.

 

(Executa-se o Hino Rio-Grandense.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Carlos Nedel): Muito obrigado a todos.

Estão encerrados os trabalhos da presente Sessão.

 

(Encerra-se a Sessão às 18h37min.)

 

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